Militares apelam ao Presidente da República
Portugal é um País de surdos, mas só para algumas questões, para outras, bem... ouvem melhor que a coruja.
Artigo do jornal 'Público'
"Militares apelam ao Presidente da República por causa de processo a coronel na reforma
12.04.2008, Filomena Fontes
Associações repudiam secretismo do Governo
A petição circula desde ontem e tem como destinatário
o Presidente da República, de quem, na qualidade de comandante
supremo das Forças Armadas, reclamam a intervenção
num caso que está a semear a indignação entre os
militares. Pedem explicitamente a Cavaco Silva que "leve a cabo as
diligências adequadas e necessárias no sentido de impedir
que um militar reformado, conhecido pela sua elevada estatura moral e
craveira intelectual, possa sofrer um processo disciplinar, no âmbito
do Regulamento da Disciplina Militar, que apenas visa humilhar publicamente
alguém que, pela sua verticalidade, coragem e saber, merece a consideração
de todos".
O caso, que rebentou publicamente esta semana, envolve directamente Luís
Fraga, um coronel reformado que enfrenta um processo disciplinar, mandado
instaurar pelo chefe de Estado-Maior da Força Aérea, de-
pois de, no blogue pessoal, se ter insurgido contra as filas de espera
que se formam à porta do hospital militar, criticando a falta de
intervenção das chefias militares e vendo nessa omissão
uma eventual subserviência ao poder político.
Para os promotores da petição, o processo é inaceitável
não só porque se se pretende aplicar o Regulamento de Disciplina
Militar (RDM) a um militar na reforma - "colocando em
causa valores como a liberdade de
expressão" conquistada com o 25 de Abril - mas também
porque con-
figura uma violação de direitos fundamentais consagrados
na Constituição Portuguesa. Na mensagem que dirigem aos
seus camaradas, os promotores anunciam a constituição de
uma comissão de solidariedade, lembram que se trata do "quinquagésimo
processo disciplinar instaurado por este Governo", acentuam a sua
particular gravidade e alertam para os perigos do projecto de novo RDM
que o Governo apresentou.
O novo RDM está, aliás, a suscitar larga controvérsia
e foi um dos temas abordados num encontro realizado anteontem em Lisboa
que juntou associações profissionais militares (ASMIR, ANS,
AOFA e APA). "O projecto do Governo do RDM é muito perigoso,
é muito nefasto em termos democráticos. É voltarmos
ao tempo da lei da rolha, em que quem falasse era castigado", declarou
ao PÚBLICO Luís Reis, da Associação de Praças
da Armada. Fernandes Torres, porta-voz da Comil (Comissão de Militares)
considera que se está perante uma proposta que "vai contra
o rumo da história e não facilita a pacificação
no interior das Forças Armadas". "O actual RDM precisa
de algumas alterações, alguns dos artigos são inconstitucionais,
mas quando a tendência na Europa é aumentar os direitos militares,
em Portugal estamos a andar ao contrário. Isto é uma afronta
às liberdades democráticas", critica.
Sublinhando que a proposta está ainda em discussão, o secretário
de Estado da Defesa, João Mira Gomes, garantiu à Lusa desconhecer
o processo que está a semear a discórdia, excluindo qualquer
intenção do Go-
verno em cercear a liberdade os direitos dos militares.
Vão muito para além do novo Regulamento de Disciplina Militar
(RDM) as questões que anteontem foram debatidas e que motivam "preocupação"
das associações profissionais militares, que se reuniram
na Casa do Alentejo, em Lisboa. A assistência na doença,
carreiras, sistema retributivo e suplementos e o complemento da pensão
de reforma são os outros dossiers que fazem adivinhar duras negociações
com o Governo. Numa moção aprovada no final do encontro,
os militares repudiam "o secretismo" que tem marcado as alterações
"em matérias que, para além de fazerem parte das competências
das negociações, são de interesse vital para os militares".
O projecto do novo RDM foi recebido no passado dia 7 e o ministro da Defesa
impôs o dia 2 de Maio como data limite para receber contributos
das associações."
