Militares apelam ao Presidente da República

Abril 22, 2008 Vice

Portugal é um País de surdos, mas só para algumas questões, para outras, bem... ouvem melhor que a coruja.

Artigo do jornal 'Público'

"Militares apelam ao Presidente da República por causa de processo a coronel na reforma

12.04.2008, Filomena Fontes

Associações repudiam secretismo do Governo

A petição circula desde ontem e tem como destinatário o Presidente da República, de quem, na qualidade de comandante supremo das Forças Armadas, reclamam a intervenção num caso que está a semear a indignação entre os militares. Pedem explicitamente a Cavaco Silva que "leve a cabo as diligências adequadas e necessárias no sentido de impedir que um militar reformado, conhecido pela sua elevada estatura moral e craveira intelectual, possa sofrer um processo disciplinar, no âmbito do Regulamento da Disciplina Militar, que apenas visa humilhar publicamente alguém que, pela sua verticalidade, coragem e saber, merece a consideração de todos".
O caso, que rebentou publicamente esta semana, envolve directamente Luís Fraga, um coronel reformado que enfrenta um processo disciplinar, mandado instaurar pelo chefe de Estado-Maior da Força Aérea, de-
pois de, no blogue pessoal, se ter insurgido contra as filas de espera que se formam à porta do hospital militar, criticando a falta de intervenção das chefias militares e vendo nessa omissão uma eventual subserviência ao poder político.
Para os promotores da petição, o processo é inaceitável não só porque se se pretende aplicar o Regulamento de Disciplina Militar (RDM) a um militar na reforma - "colocando em
causa valores como a liberdade de
expressão" conquistada com o 25 de Abril - mas também porque con-
figura uma violação de direitos fundamentais consagrados na Constituição Portuguesa. Na mensagem que dirigem aos seus camaradas, os promotores anunciam a constituição de uma comissão de solidariedade, lembram que se trata do "quinquagésimo processo disciplinar instaurado por este Governo", acentuam a sua particular gravidade e alertam para os perigos do projecto de novo RDM que o Governo apresentou.
O novo RDM está, aliás, a suscitar larga controvérsia e foi um dos temas abordados num encontro realizado anteontem em Lisboa que juntou associações profissionais militares (ASMIR, ANS, AOFA e APA). "O projecto do Governo do RDM é muito perigoso, é muito nefasto em termos democráticos. É voltarmos ao tempo da lei da rolha, em que quem falasse era castigado", declarou ao PÚBLICO Luís Reis, da Associação de Praças da Armada. Fernandes Torres, porta-voz da Comil (Comissão de Militares) considera que se está perante uma proposta que "vai contra o rumo da história e não facilita a pacificação no interior das Forças Armadas". "O actual RDM precisa de algumas alterações, alguns dos artigos são inconstitucionais, mas quando a tendência na Europa é aumentar os direitos militares, em Portugal estamos a andar ao contrário. Isto é uma afronta às liberdades democráticas", critica.
Sublinhando que a proposta está ainda em discussão, o secretário de Estado da Defesa, João Mira Gomes, garantiu à Lusa desconhecer o processo que está a semear a discórdia, excluindo qualquer intenção do Go-
verno em cercear a liberdade os direitos dos militares.
Vão muito para além do novo Regulamento de Disciplina Militar (RDM) as questões que anteontem foram debatidas e que motivam "preocupação" das associações profissionais militares, que se reuniram na Casa do Alentejo, em Lisboa. A assistência na doença, carreiras, sistema retributivo e suplementos e o complemento da pensão de reforma são os outros dossiers que fazem adivinhar duras negociações com o Governo. Numa moção aprovada no final do encontro, os militares repudiam "o secretismo" que tem marcado as alterações "em matérias que, para além de fazerem parte das competências das negociações, são de interesse vital para os militares". O projecto do novo RDM foi recebido no passado dia 7 e o ministro da Defesa impôs o dia 2 de Maio como data limite para receber contributos das associações."